quinta-feira, 24 de março de 2011

Esta data tão querida

Eu sendo feliz

O que nos dizem no dia do nosso aniversário:
"Parabéns! Tudo de bom para você! E muitos anos de vida!"

O que deveriam nos dizer no dia do nosso aniversário:
"Meus pesames, você está 1 ano mais próximo da sua morte.Mas não se preocupe, isso acontece com todo o mundo uma vez por ano. Espero que você viva tempo suficiente para realizar tudo o que tem vontade. Mas olha, se eu fosse você, me apressava."

Engraçado, mas sempre penso no presente não como uma forma de parabenização, mas de consolo.

Hoje, as 10h54, eu nascia no Hospital São Luiz, no bairro de Jardim Paulista, em São Paulo.
Minha mãe disse que eu não chorei. Fiquei com os olhos esbugalhados olhando para as coisas em volta. Na certa eu estava com muita raiva por terem me tirado do meu conforto uterino e me colocado em que mundo bem esquisito, que eu tentava reconhecer.


E, para que esse post não fique muito lúgubre, digo a todos que se preocupam e que estejam ligados a mim: Hoje, aos 21, ainda não reconheço o mundo no qual me puseram. Mas, sabe, no fim das contas, acho que ele também não me reconhece. Por isso não me importo tanto assim.

=P

terça-feira, 22 de março de 2011

Something in the way


Me alimentei das palavras por você proferidas. Das horas que passaram incólumes por nossos desejos reprimidos. Seu perfil ardia contra o Sol que deslizava rápido em direção a linha que separava o céu do mar. E tão rápido o Sol se pôs que escureceu o nosso amor. Ainda posso te sentir nos átomos do universo ao meu redor e nas moléculas confusas que constituem o meu ser. Em cada vão, em cada esquina, em cada beco sem saída, eu esperava por ti...E te busquei noite adentro, nas dobras do meu corpo, no suor da minha pele, no cheiro da minha roupa que, mesmo lavando muito, ainda guarda algo de ti. Mas só encontrei um pedaço rasgado de você. A parte mais obscura e sem graça, que você esqueceu rabiscada nas entranhas do livro tombado na estante.

*

Sem pedir licença, mas com aviso antecipado, seu beijo doce - daquele doce enjoativo - desceu pela minha garganta da forma exata. Tão certeiro foi, que no momento planejado anulou em equilíbrio o gosto amargo da minha boca seca. A garoa lá de fora formada por gotas bem miúdas, parecia dançar contra o vento frio que soprava mansamente só para a gente, para completar nosso espetáculo. As gotas que se acumulavam no vidro da cafeteria, tão ingênuas e fascinantes, foram as únicas testemunhas curiosas que ousaram enfeitar nossa tarde derradeira.

*

 “Agora vá e não olhe para trás". Te levo no beijo sofrido e na imagem embaçada do olhar marejado. Porque você se move, me olha, se cala e me encara como nenhum outro. E eu, tão tonta de você, me entrego logo. Aquele gosto enjoativo me guiou até você no escuro. No abismo infinito em que você me prendeu, me sentiu, me despiu  e cuspiu sem gratidão.

*

 Mas agora corra, meu amor. É sua chance derradeira. Você está no caminho exato do meu coração. Falta pouco! Se aproxime mais e lhe estenderei as mãos, que gesticulam impacientes esperando seu contato.
 E foi assim, tão de repente, que você optou por ficar pelo caminho, parado na contramão.
Olhe a hora, agora é tarde. O tempo se esgotou. O Sol já se foi. Acaba de se pôr. Ele partiu rápido, sem dar explicação, e junto partiu sem volta o meu coração.

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Dedico este texto (que não tem nem a  metade da qualidade que eu gostaria) à @pollibud

quarta-feira, 16 de março de 2011

Substantivo inconcreto


Tenho pra dizer milhões de coisas
das palavras nunca ousadas.
Todas cheias de poeira
na estante enferrujada

Esperei minha vida inteira,
pelo amor-mais-que-perfeito
que com seu charme tão verbal
transformasse o meu sujeito
em predicado nominal.
Quando enfim chegou,
perguntei-lhe a que veio
e quis dar-me uma função.
Mexeu com meus sentidos
e completei minha oração.

Acerto o tempo e boto o verbo
sim, concordo com a sentença! o momento é decisivo!
sem medo e sem frescura junto logo meu objeto
ao seu verbo transitivo

Entrego à sorte, engulo em seco
encho o peito e solto a voz

Mas é justamente nessa hora
que a frase é reduzida, 
pra que não a acusem de ser infitiva.
e as palavras ansiosas,
a espera de incentivo,
da porra de um verbo
que só pode ser intransitivo!

sexta-feira, 11 de março de 2011

Introdução, metodologia e conclusão ou das coisas que não acontecem...

Do que havia pra falar, calei
Do que havia pra gastar, amealhei
Do que havia pra sentir, ignorei
Do que havia pra gostar, resignei
Do que havia...
Tinha seu gosto, tinha seu gozo, tinha seu tato, tinha seu jeito, tinha seu cheiro, tinha seu pêlo, tinha sua pele
E tudo mais aquilo
Que no fundo veio forte e no fundo ficou,
sorrateiro,
soterrado.
da negação que, não fosse ela, ninguém sabe onde isso ia parar...

quarta-feira, 9 de março de 2011

Título: Várias horas no Paint para fazer esse desenho tosco. (Bits sobre tela)








Sabe, o problema de crescer...


é que a gente vai ficando cada vez mais sintético.

sábado, 5 de março de 2011

Colombina, Colombina, meu amor

          Pierro, Arlequim e Colombina
            de Di Cavalcanti

No dia em que o Arlequim se apaixonou pela Colombina
Ele implorou cantando, serviu a moça e deu seu mundo
Ela fez pouco caso, riu sem jeito e esbanjou charme
O Pierrot chegou meio tímido, com flores murchas e um anel sem graça
Vestia trapos de palhaço, escondendo o rosto humilhado, enquanto todos lhe diziam "és um desgraçado"
A Colombina orgulhosa, uma dama respeitada,
Recebeu o mundo, aceitou as flores e vestiu o anel.
Foi quando Pantaleão, mercador galante e esnobe
Levou a Colombina
Na carruagem mais nobre
O Arlequim e o Pierrot, no carnaval da vida sofrida
suspiraram e cantaram

"Colombina, sua puta!"
  
  

sexta-feira, 4 de março de 2011

Transporte público em Natal: quem conhece, desconfia

Empresas de ônibus da cidade obrigam usuários a viajar em veículos antigos, que quebram constantemente
Por Helena Maziviero para Agência Fotec
 
Ônibus antigos que quebram constantemente fazem parte da rotina dos passageiros de Natal (Foto: Helena Maziviero/Fotec)Ônibus antigos que quebram constantemente fazem parte da rotina dos passageiros de Natal (Foto: Helena Maziviero/Fotec)


Próximo ao horário do almoço, por volta das 11h30, Carlos Cunha, um aposentado de 67 anos, espera o ônibus na Avenida Salgado Filho, uma das principais vias da cidade. “Aqui deveriam passar mais ônibus. Já faz tempo que não passa nenhum”, reclama. Ele vai para a Zona Sul, em uma região de divisa, desprovida de responsabilidade administrativa e onde as cidades de Natal e Parnamirim brigam para resolver de quem é o filho resultante do crescimento urbano não planejado.
Dois ônibus se aproximam. Carlos inclina o corpo para frente e dá o sinal de parada. O primeiro ônibus estaciona e abre as portas esperando o embarque. Carlos faz que não com o dedo e explica que o veículo certo é o que está atrás. Mas já é tarde. O transporte tão esperado havia passado rápido pela esquerda, sem se preocupar com o senhor que o aguardava. “Que absurdo!”, reclama o passageiro ignorado.
Carlos segura firme uma pasta de couro entre os braços e já está bastante impaciente, vociferando contra o transporte público da cidade. Senta-se novamente no banco e faz a única coisa que lhe resta: esperar.
Muitos ônibus mais tarde, o Nova Parnamirim - via Maria Lacerda finalmente aponta no horizonte. Em um sobressalto, Carlos estica o braço e quase implora a parada do veículo. Dessa vez ele obtém sucesso. Exibe a carteira de identidade que garante a gratuidade em transportes públicos e entra pela porta traseira. Antes que Carlos tenha tempo de se acomodar em um dos bancos, o ônibus arranca e segue viagem.
Já na BR 101, o veículo está lotado principalmente por estudantes, que preenchem os poucos espaços vazios do coletivo com bolsas, livros e cadernos, obstruindo ainda mais o caminho de quem ousa se locomover. Mesmo assim, o ônibus segue inabalável seu trajeto, até o momento em que um ruído incomum, vindo das engrenagens do veículo, une-se ao ronco costumeiro do motor e faz com que o ônibus comece a perder velocidade, até parar no acostamento da rodovia.
O motorista desce para verificar. Os passageiros aguardam ansiosos, esticando o pescoço para enxergar o que se passa. Com expressão de desapontamento, o condutor do veículo anuncia a sentença: “Terão de trocar de carro. Esse quebrou.”. Depois do murmúrio geral de insatisfação, os passageiros se aglomeram no ponto de ônibus mais próximo. Carlos está lá, segurando sua pasta de couro e dividindo sua insatisfação com qualquer pessoa que esteja a sua volta. “Esses ônibus são todos velhos, vivem quebrando. Não tem sequer um que preste”, reclama.
O transporte público de Natal, que, na verdade, se resume às linhas de ônibus, estava demonstrando o quão ineficiente e precário é o sistema do qual dependem diariamente milhares de pessoas.
Motoristas mal educados, horário irregular, atrasos, passagens elevadas e frota antiga, muitas vezes sem acesso para deficientes, são elementos que fazem parte do cotidiano de quem utiliza o transporte público da cidade. Mas, naquele momento, o descontentamento geral se percebeu quando um ônibus recém-chegado teve de enfrentar a fúria dos passageiros que embarcavam rápido pela porta traseira. O motorista anuncia que não pode, já que o veículo quebrado pertencia a uma empresa diferente. “Vocês devem esperar um ônibus que seja da mesma empresa”, informa o condutor. Tarde demais. Do meio da multidão alguém grita: “Depois que eu subir, quero ver quem me tira!”. De dentro do ônibus o cobrador reclama, dizendo que a demora no embarque está atrasando o horário do veículo. O cobrador comenta que, na verdade, ele e o motorista estão fazendo um favor aos passageiros do ônibus quebrado. “Não é nossa obrigação”, anuncia convicto.
Em total desconforto, todos finalmente embarcam e seguem viagem. Inclusive Carlos, que viajou em pé segurando a pasta de couro. No desembarque, o aposentado se atrapalha, aguardando em frente a uma porta dedicada aos deficientes e que tinha a inscrição “Desembarque pela porta trazeira”. Assim mesmo, com “z”.

A superlotação e as passagens caras são alguns dos problemas do transporte público de Natal (Foto: Helena Maziviero/Fotec)
A superlotação e as passagens caras são alguns dos problemas do transporte público de Natal (Foto: Helena Maziviero/Fotec)


[Relato do repórter] A pauta mora ao lado
Eu estava sem pauta, sentada em um ponto de ônibus no meio da Avenida Salgado Filho. Minha intenção inicial, de falar sobre o abandono do teatro municipal Sandoval Wanderley, não rendeu matéria. A professora me disse que uma outra aluna, no semestre passado, já havia feito uma reportagem com esse tema. Era verdade. Conferi no site da Fotec a ótima matéria escrita por Diana Coelho.
Eu queria algo diferente. Um assunto que não estivesse lá, só esperando para ser explorado. Queria descobrir alguma coisa nova, algum personagem representativo e aparentemente pequeno diante da imensidão dos assuntos que normalmente preenchem os veículos jornalísticos.
Lembrei de um senhor muito idoso que, mesmo aposentado, teimava em servir de guia turístico e cuidar do teatro Alberto Maranhão. Liguei para a bilheteria perguntando pelo seu Pedro, como é carinhosamente chamado. A moça do outro lado da linha me informou que ele não trabalha mais lá, que foi substituído por outra funcionária. Desligo o telefone desapontada. Eu até poderia fazer um trabalho investigativo, descobrir onde mora o seu Pedro e ir até sua casa, mas definitivamente não seria a mesma coisa. Minha idéia era a de que ele me guiasse pelo teatro, contando as famosas histórias de assombrações de atores mortos que vagam pelo prédio centenário.
Em meio à minha angustiante falta de criatividade por não conseguir pensar em sequer um assunto interessante para um trabalho de faculdade, eis que quase não reparo em um senhor um tanto caricato, sentado ao meu lado no ponto de ônibus.
Ele veste uma camiseta listrada de gola e usa os poucos cabelos brancos que lhe restam muito bem penteados. Seu nome é Carlos Cunha e está reclamando dos ônibus de Natal, da falta de respeito dos motoristas e do preço da passagem. Começamos a conversar e descubro que temos o mesmo destino. Espero o ônibus junto com ele. No fim das contas, a companhia de Carlos e a viagem me renderiam uma boa pauta. Chegando em casa, escrevi a matéria. (Helena Maziviero)