sexta-feira, 20 de abril de 2012

Caralho!


Ilustração de Carybé


Recordando essas coisas enquanto preparavam o baú de José Arcádio, Úrsula se perguntava se não era preferível deitar de uma vez na sepultura e que jogassem terra em cima, e perguntava a Deus, sem medo, se de verdade achava que as pessoas eram feitas de ferro para suportar tantos padecimentos e mortificações; e perguntando e perguntando ia atiçando sua própria confusão, e sentia uns desejos irreprimíveis de desandar a dizer palavrões e xingamentos como se fosse um daqueles forasteiros, e de se permitir enfim um instante de rebeldia, o instante tantas vezes ansiado e tantas vezes adiado e mandar a resignação à merda, e cagar de uma vez para tudo, e arrancar do coração os infinitos montões de palavrões que tinha precisado engolir num século inteiro de conformismo.
-Caralho! - gritou.
Amaranta, que começava a pôr a roupa no baú, pensou que ela tinha sido picada por um escorpião.
- Onde está? - perguntou alarmada.
- O quê?
_ O animal! - esclareceu Amaranta.
Úrsula pôs o dedo no coração.
- Aqui - disse.

(Trecho do livro Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Márquez)


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Sumindo por uns tempos. Sentimentos rarefeitos, palavras inertes.

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